O desprezo contemporâneo da doutrina da providência

A palavra providência etimologicamente significa ver antes ou ver de antemão, não no sentido restrito de que Deus é um mero espectador dos acontecimentos, mas Deus é aquele que não somente criou todo o cosmos e tudo que nele há, mas também rege, dirige, controla e governa a história humana, por meio de sua Mão invisível, onde nada, absolutamente nada, foge ao seu controle absoluto. Aquele que criou todas as coisas pela Palavra do seu poder, é o mesmo que sustenta, rege e está envolvido com a sua criação.

Porém, o conceito de Providência de Deus tem mudado através da história. Até o século XIX havia um agudo senso sobre o olhar providente de Deus na sociedade, assumindo que Deus era Todo Poderoso e estava diretamente envolvido na vida diária das pessoas. A mentalidade cultural de hoje é tipificada pelo seguinte questionamento: Há Alguém lá em cima que pode e queira me ajudar?… Primeiro, o homem do século XXI está incerto de que um Ser Onipotente realmente existe. Segundo, Ele questiona se esse Ser é pessoal, e se, de forma última, está no controle do universo. Terceiro, Se existe esse Ser, indaga ainda o homem pós-moderno, se Ele tem habilidade de ajudar. Quarto, se esse Deus existe e é capaz de ajudar, o homem questiona se ele realmente quer ajudar.

Historicamente, podemos elencar algumas razões que levaram a sociedade e até mesmo a igreja cristã a demonstrar certa despreocupação pela doutrina da providência:

1. O desenvolvimento do naturalismo científico do século XIX. Os fundamentos do cristianismo foram questionados pelo ensino do evolucionismo. Os efeitos apareceriam mais tarde na fraqueza da teologia cristã minada por cientificismo humanista. O estudo da ciência começou dispensando a ideia do Deus presente neste mundo por enfatizar o naturalismo. Todos os fenômenos acontecidos neste mundo passaram a possuir uma causa natural (universo mecânico fechado), não tendo uma causalidade fora de si mesmo, isto é, na obra providencial de Deus. A natureza começou a ser estudada como auto causada e independente (mãe natureza), onde o estudo dos fenômenos físicos ficou restrito a causas naturais.

2. O aparecimento da subjetividade da religião. Toda manifestação religiosa não passava de uma erupção de sentimentos vindos do coração. Passou-se a crer que a religião era apenas uma expressão de nossas necessidades egoístas e interiores e somente condicionadas ao âmbito humano. A religião tornou-se apenas uma projeção do homem cercado pelos poderes da natureza (Freud). Marx concebeu a religião como o ópio do povo, que servia para entorpecê-lo diante dos sofrimentos. O existencialista Nietzche, afirmou que Deus estava “morto”.

3. A erupção das duas grandes guerras. Após a Primeira e a Segunda Guerra Mundial a sociedade entrou num processo emancipatório em relação a existência de Deus e a Sua bondade providencial no mundo, ou seja, a pergunta que ecoava nos corações era: como acreditar num Deus bondoso diante de tanto sofrimento, maldade e destruição?

Diante das considerações acima, precisamos como igreja, elevarmos nosso pensamento cativo a Cristo e a Sua Palavra. As Escrituras afirmam que os males presentes no mundo são decorrentes da emancipação do homem em relação a Deus e a Sua Palavra, trazendo maldição sobre si e sobre a criação. Portanto, meus irmãos, sabemos que Deus tem o controle absoluto sobre tudo e todos, onde não há nenhuma molécula maverick solta no espaço e que devemos, como cristãos bíblicos e reformados , nos quedar diante da sua Palavra e do seu cuidado providente sobre as nossas vidas. Termino este texto citando um comentário da Bíblia de Genebra (pág. 749) , “… A doutrina da providência ensina aos cristãos que eles nunca estão presos à sorte cega, à casualidade, ao acaso ou ao destino. Tudo o que lhes acontece é divinamente planejado, e cada acontecimento chega como um novo convite a confiar, a obedecer e a regozijar-se, sabendo que todas as coisas ocorrem para o seu bem espiritual e eterno (Rm 8.28)”.

Rev. Marcus Nolasco de Abreu

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